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Divergência breca concessão de rodovias |
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14/08/2006 |
SÃO PAULO - Técnicos do TCU (Tribunal de Contas da União) e do governo federal não conseguem chegar a um acordo sobre os estudos que servirão de base para a elaboração dos editais de concessão de rodovias federais para a iniciativa privada. O problema está na definição do nível de risco regulatório do investimento, do volume de recursos privados necessários para obras e na taxa de retorno.
Esses três fatores influenciam diretamente a tarifa de pedágio que será cobrada dos usuários. Enquanto a discussão prossegue, o edital não sai. Entre as rodovias a serem concedidas estão a Régis Bittencourt (SP-Curitiba) e a Fernão Dias (SP-Belo Horizonte), que figuram no ranking das que mais matam no país. Segundo a Folha apurou, há entendimento dentro do governo de que o TCU está extrapolando suas funções, ao tentar forçar critérios que levem a tarifas mais baixas para os usuários. O governo teme que, com tarifas "artificialmente" baixas, não haja interessados nos trechos a serem concedidos.
O governo também deseja evitar que, sem conseguir atrair um operador especializado em concessões rodoviárias, uma empresa ou consórcio sem a necessária habilitação técnica assuma uma rodovia importante, vindo a abandoná-la depois ou a entrar na Justiça contra o governo para forçar um aumento de tarifa.
O tribunal, por sua vez, se exime de culpa. Informa que não está definindo política tarifária nem os demais critérios do edital diretamente ligados à tarifa de pedágio: taxa de retorno, quantidade e preço das obras a serem feitas pelo investidor e nível de risco. O tribunal argumenta que apenas exigiu que o governo explicasse melhor seus critérios.
Do ponto de vista do TCU, qualquer taxa de retorno, nível de investimento ou de exposição ao risco regulatório pode ser usada para elaborar o edital, desde que o governo consiga comprovar tecnicamente como fez suas opções. Nos estudos colocados em consulta pública pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), que atenderam em parte às determinações do TCU, o valor teto do pedágio oscilou de R$ 3,12 a R$ 4,61, dependendo do trecho. Para ganhar a concessão, os investidores teriam que oferecer tarifas menores do que essas. Esses valores foram considerados insuficientes por potenciais investidores privados.
Após consulta pública, deverão ser incorporadas obras pedidas por usuários, o que deve elevar o volume de investimentos e, conseqüentemente, a tarifa teto. No caso da Régis Bittencourt (SP-Curitiba), o gasto em obras da iniciativa privada subiria de R$ 1,6 bilhão para R$ 2,1 bilhões, e a tarifa, de R$ 3,12 para cerca de R$ 3,60. Também haveria aumento na Fernão Dias (SP-Belo Horizonte). Os investimentos privados subiriam de R$ 1,4 bilhão para R$ 1,9 bilhão, e a tarifa de pedágio, de R$ 3,22 para R$ 3,60.
Retorno - No primeiro leilão de concessões rodoviárias, quando foram concedidas a Via Dutra (SP-Rio) e a ponte Rio-Niterói, a taxa interna de retorno do investimento era de aproximadamente 17% ao ano. Na ocasião (1995), no entanto, o país tinha uma taxa de juros muito mais alta e nenhuma experiência em concessões rodoviárias. O risco, portanto, era maior e era preciso mais rentabilidade para atrair o investidor privado. Para as novas concessões, feitas em um ambiente de juros menores e de mais experiência com concessões, o governo trabalha com taxa de retorno próxima de 15% ao ano.
Concorrência - Técnicos do TCU também recomendaram que o governo desse um desconto de aproximadamente 30% nos custos estimados para as obras. Segundo o tribunal, esse é o desconto médio que o Dnit (Departamento Nacional de Infra-Estrutura em Transportes) consegue nas suas licitações. Os técnicos avaliam que, por serem empresas privadas, as concessionárias terão condições de conseguirem descontos ainda maiores. O governo federal, no entanto, avalia que é um erro usar a tabela com desconto, porque a própria concorrência no leilão levaria o preço para baixo. Na opinião dos técnicos do TCU, não há como garantir que haverá concorrência e, dessa forma, uma superestimativa de investimento levaria a um preço teto de pedágio desnecessariamente alto. Em caso de pouca concorrência, o consumidor pagaria tarifas muito altas ao longo de todo o período da concessão (25 anos).
A Folha procurou o Ministério dos Transportes e a ANTT para comentar os problemas no programa de concessão de rodovias, mas os órgãos não quiseram se pronunciar.
Fonte:
Folha de S. Paulo
14/8/2006 |
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